Este Informativo, elaborado a partir de notas tomadas nas sessões de julgamento das Turmas e do Plenário, contém resumos não-oficiais de decisões proferidas pelo Tribunal. A fidelidade de tais resumos ao conteúdo efetivo das decisões, embora seja uma das metas perseguidas neste trabalho, somente poderá ser aferida após a sua publicação no Diário da Justiça.
Plenário
Alíquota de ICMS e Resolução do Senado - 1
Alíquota de ICMS e Resolução do Senado - 2
Remuneração de Servidor Público e Vício Formal Tribunal de Contas: Lei Orgânica e Vício Formal
Tribunal de Contas: Composição e Modelo Federal
Concurso Público para Cargo de Procurador da República e Requisito Temporal
Inquérito e Redução a Condição Análoga à de Escravo - 1
Inquérito e Redução a Condição Análoga à de Escravo - 2
Inquérito e Redução a Condição Análoga à de Escravo - 3
Interrogatório: Lei 11.719/2008 e Lei 8.038/90
Repercussão Geral
Revisão Geral de Remuneração (28,86%): Servidores Civis e Militares
1ª Turma
Crimes da Lei 8.666/93: Prestação de Serviços e Enquadramento
Prisão Cautelar e Excesso de Prazo
Crime de Descaminho e Princípio da Insignificância
Crime de Furto: Qualificadora e Nulidade de Perícia
Agravo em Execução e “Habeas Corpus”
Processo Penal Militar e Dupla Intimação
Portador do Vírus HIV e Tentativa de Homicídio – 2
2ª Turma
Apelação Criminal e Nulidades - 1
Apelação Criminal e Nulidades - 2
Apelação Criminal e Nulidades - 3
Superveniência de Condenação e Alteração da Data-Base
Comutação de Pena e Revogação de Livramento Condicional
Repercussão Geral
Transcrições
CODESP e Imunidade (RE 253472/SP)
Inovações Legislativas
O Tribunal iniciou julgamento de embargos de divergência em que se discute a incidência, ou não, de ICMS na saída de produtos semi-elaborados remetidos para o exterior entre 1º.3.89 a 31.5.89. Trata-se, na espécie, de embargos opostos contra acórdão da 1ª Turma, que não conhecera de recurso extraordinário da empresa contribuinte, ora embargante. Reputara que, ante a falta de fixação de alíquota do referido imposto pelo Senado Federal, a partir do advento da CF/88, o Estado de São Paulo poderia fazê-lo (Lei 6.374/89), com base na Resolução 129/79, do Senado Federal, vigente ao tempo da CF/69 que estabelecia competir àquela Casa Legislativa a fixação de alíquotas máximas para as operações do ICMS. Invoca-se como paradigma o acórdão proferido pela 2ª Turma no RE 145491/SP (DJU de 20.2.98), em que assentada a não-incidência do ICMS na saída de tais produtos no aludido período até a edição da Resolução 22/89, também do Senado Federal, que fixou as alíquotas aplicáveis às operações de exportação em cumprimento à norma constitucional (CF/88, art. 155, § 2º, IV). O Min. Ricardo Lewandowski, relator, acolheu os embargos de divergência para prover o recurso extraordinário. Aduziu que o cerne da questão seria saber se os efeitos da Resolução 129/79 perdurariam até a edição da Resolução 22/89, a teor do que dispõe o § 5º do art. 34 do ADCT, ou se ela deixaria de ter incidência após o primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, conforme estatui o caput do mesmo dispositivo constitucional (ADCT: “Art. 34. O sistema tributário nacional entrará em vigor a partir do primeiro dia do quinto mês seguinte ao da promulgação da Constituição, mantido, até então, o da Constituição de 1967, com a redação dada pela Emenda nº 1, de 1969, e pelas posteriores. ... § 5º - Vigente o novo sistema tributário nacional, fica assegurada a aplicação da legislação anterior, no que não seja incompatível com ele e com a legislação referida nos § 3º e § 4º.”).
RE 208277 EDv/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 6.10.2010. (RE-208277)
Considerou que o mencionado art. 155, § 2º, IV, da CF/88 (“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: ... II - operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior; ... § 2.º O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte: ... IV - resolução do Senado Federal, de iniciativa do Presidente da República ou de um terço dos Senadores, aprovada pela maioria absoluta de seus membros, estabelecerá as alíquotas aplicáveis às operações e prestações, interestaduais e de exportação;”) instituiu um poder-dever ao Senado Federal de estabelecer as alíquotas aplicáveis às operações de exportação, distinto daquele definido pelo regime constitucional anterior, consistente em apenas fixar a alíquota máxima para essas atividades. Desse modo, enfatizou que o próprio Senado, ao editar a Resolução 22/89 — para determinar como alíquota do ICMS nas exportações o teto adotado pela Resolução 129/79 —, implicitamente reformara o ato editado sob o regime anterior, reconhecendo que ele não fora recepcionado pela atual Constituição. Concluiu, dessarte, que o acórdão invocado como paradigma pela embargante melhor atenderia ao modelo constitucional instituído em 1988. Em divergência, o Min. Dias Toffoli rejeitou os embargos e manteve a decisão embargada. De início, assinalou que, na vigência da Carta pretérita, competiria ao Senado estabelecer a alíquota máxima do ICMS incidente nas exportações (art. 23, § 5º), ficando a cargo dos Estados-membros a fixação da alíquota em concreto. Em seguida, salientou que, com o advento da CF/88, o Senado teria competência para estabelecer alíquotas de incidência aplicáveis a operações de exportação e não mais o seu teto. Entendeu que, por força do art. 34, § 5º, do ADCT, no período questionado, a Resolução 129/79 continuara validando a incidência do ICMS nas operações de exportação em harmonia com o art. 155, § 2º, IV, da CF/88. Dessa forma, asseverou que, na situação sob análise, a Lei paulista 6.374/89, a qual entrara em vigor exatamente em 1º.3.89, dispusera ser cabível a alíquota de 13%, a mesma prevista na Resolução 129/79, até que o Senado viesse a exercer a competência dada pela nova Constituição. Após, pediu vista a Min. Ellen Gracie.
RE 208277 EDv/SP, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 6.10.2010. (RE-208277)
O Tribunal deferiu pedido de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, proposta pelo Governador do Estado de Santa Catarina, para suspender, com efeitos ex nunc, o art. 3º da Lei 15.215/2010, daquela unidade federativa. O dispositivo impugnado, resultante de emenda parlamentar, fixa o subsídio mensal como forma de remuneração dos membros da carreira de procurador do Estado e cria gratificações em favor dos servidores públicos da Procuradoria-Geral do Estado, da Secretaria de Estado da Administração e do Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina. Vislumbrou-se aparente usurpação da iniciativa privativa do Chefe do Poder Executivo para a propositura de leis que disponham sobre aumento de remuneração dos cargos, funções e empregos públicos existentes na estrutura da Administração direta ou autárquica (CF, art. 61, § 1º, II, a), bem como ofensa à vedação de emenda a projeto de lei de iniciativa da citada autoridade que acarrete aumento de despesa (CF, art. 63, I). Precedente citado: ADI 1070 MC/MS (DJU de 15.5.95).
ADI 4433 MC/SC, rel. Min. Ellen Gracie, 6.10.2010. (ADI-4433)
Por considerar usurpado, em princípio, o poder de iniciativa reservado constitucionalmente aos Tribunais de Contas para instaurar processo legislativo que visa alterar sua organização e seu funcionamento, o Tribunal deferiu, com efeitos ex tunc, pedido de medida cautelar em duas ações diretas de inconstitucionalidade propostas, respectivamente, pela Associação dos Membros dos Tribunais de Contas do Brasil - ATRICON e pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, para suspender a eficácia da Lei 2.351/2010, do Estado de Tocantins. A norma impugnada, de origem parlamentar, alterou e revogou diversos dispositivos da Lei Orgânica do Tribunal de Contas daquele ente federativo. Preliminarmente, na linha de precedentes firmados pela Corte, assentou-se a legitimidade ativa ad causam da ATRICON, bem como se entendeu configurada a pertinência temática. Em seguida, sem adentrar o exame de cada artigo do diploma adversado, reputou-se configurado o aparente vício de iniciativa, porquanto não caberia ao Poder Legislativo estadual, mediante projeto de lei de iniciativa parlamentar, propor modificações em dispositivos da Lei Orgânica do Tribunal de Contas estadual. Enfatizou-se que apenas a própria Corte de Contas teria a prerrogativa de fazer instaurar processo legislativo concernente à alteração desse diploma normativo, sob pena de se neutralizar sua atuação independente. Consignou-se, por fim, que a lei em questão, além de acarretar conflitos institucionais entre o Tribunal de Contas e a Assembléia Legislativa, subtrairia daquele competências fiscalizatórias e interferiria em sua autonomia administrativa e financeira. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia a medida cautelar com eficácia ex nunc por considerar que a natureza do pronunciamento do Supremo seria acautelador e não reparador. ADI 4418 MC/TO,rel. Min. Dias Toffoli, 6.10.2010. (ADI-4418)
ADI 4421 MC/TO, rel. Min. Dias Toffoli, 6.10.2010. (ADI-4421)
O Tribunal deferiu pedido de medida cautelar em ação direta de inconstitucionalidade, ajuizada pelo Partido da Social Democracia Brasileira - PSDB, para suspender, com eficácia ex tunc, a vigência do § 3º do art. 307 da Constituição do Estado do Pará, acrescido pela EC 40/2007. O preceito impugnado dispõe ser de livre escolha do Governador o provimento das vagas de Conselheiro do Tribunal de Contas do Estado e do Tribunal de Contas dos Municípios, na falta de auditor ou de membros do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas que preencham os requisitos para a nomeação. Considerou-se, à primeira vista, desrespeitada a Constituição, cuja sistemática, no que se refere ao Tribunal de Contas, se aplica às unidades da federação. Observou-se, ademais, que o mencionado Estado-membro já teria sido advertido pelo Supremo relativamente à discrepância do modelo de organização do Tribunal de Contas local com o modelo constitucional vigente. Registrou-se, consoante salientado pela Procuradoria-Geral da República, inexistir espaço para soluções normativas que se prestassem a um atraso ainda maior na implementação do modelo constitucional. Afirmou-se, ainda, que a Corte de Contas estadual teria comunicado oficialmente à Governadora do Estado a existência de vaga a ser preenchida por ocupante do cargo de Auditor e que o único integrante da classe não atenderia a todos os requisitos necessários à nomeação. Vencido o Min. Marco Aurélio que deferia a medida cautelar com eficácia ex nunc pelos fundamentos expostos no caso acima relatado.
ADI 4416 MC/PA, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 6.10.2010. (ADI-4416)
Ante as peculiaridades do caso, o Tribunal, por maioria, deferiu mandado de segurança para assegurar ao impetrante o direito que lhe advenha da aprovação no 24º concurso público para provimento de cargos de Procurador da República. Na espécie, o Procurador-Geral da República denegara a inscrição definitiva do impetrante ao fundamento de não estar atendido o requisito de 3 anos de atividade jurídica previsto no art. 129, § 3º, da CF. Nada obstante, em razão de medidas liminares concedidas pelo STF, o impetrante prosseguira no certame e obtivera aprovação na fase oral. Inicialmente, salientou-se que a pretensão do impetrante não afrontaria o entendimento firmado pela Corte no julgamento da ADI 3460/DF (DJU de 15.6.2007), segundo o qual os 3 anos de atividade jurídica são contados da data da conclusão do curso de Direito e devem ser comprovados na data da inscrição no concurso. Observou-se que o impetrante colara grau como bacharel em Direito em 13.1.2005, e que 18.8.2008 fora o último dia das inscrições definitivas no certame. Em passo seguinte, registrou-se que a controvérsia residiria no período de 13.1.2005 a 31.3.2006, quando o impetrante exercia o cargo, não-privativo de bacharel em Direito, de assessor da direção-geral junto à assessoria jurídica da Direção-Geral do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. Reputou-se que as atividades desempenhadas pelo impetrante no referido período seriam de natureza jurídica. Ademais, enfatizou-se que o cargo de assessor, incompatível com o exercício da advocacia, embora não fosse privativo de bacharel em Direito no Estado do Rio Grande do Sul, o seria em outras unidades da federação. Por outro lado, aduziu-se que, ainda que não considerado o tempo de exercício no cargo de assessor da Direção-Geral do Ministério Público gaúcho, o impetrante preencheria o requisito temporal, haja vista que se inscrevera na Ordem dos Advogados do Brasil em 6.9.2005 e, consoante já afirmado, a inscrição definitiva no concurso se dera em 18.8.2008. Dessa forma, se ignorado o tempo de exercício no aludido cargo de assessor, o termo inicial da atividade jurídica do impetrante, como advogado, seria sua inscrição na OAB. Ressaltou-se que, nesta hipótese, faltar-lhe-iam apenas 19 dias para o atendimento dos requisitos, entretanto, esse período corresponderia a prazo razoável para a expedição da carteira de advogado após o seu requerimento. O Min. Cezar Peluso, Presidente, concedia a ordem ante a situação de fato consolidada. Vencidos os Ministros Dias Toffoli, Cármen Lúcia e Ricardo Lewandowski que, ao ressaltar o exercício do cargo de assessor pelo impetrante antes da conclusão de seu bacharelado, denegavam a segrança por julgar ausente direito líquido e certo. Precedentes citados: Rcl 4906/PA (DJe de 11.4.2008) e MS 26681/DF (DJe de 17.4.2009).
MS 27604/DF, rel. Min. Ayres Britto, 6.10.2010. (MS-27604)
O Tribunal iniciou julgamento de inquérito no qual se imputa a Senador da República e a co-denunciado a suposta prática dos tipos penais previstos nos artigos 149, 203, §§ 1º e 2º e 207, §§ 1º e 2º, todos do CP, em concurso formal homogêneo. No caso, a inicial acusatória narra que, a partir de diligência realizada por grupo de fiscalização do Ministério do Trabalho e Emprego - MTE, constatara-se que os denunciados teriam, no período de janeiro e fevereiro de 2004, reduzido aproximadamente 35 trabalhadores a condição análoga à de escravos, inclusive com a presença de menor de idade entre os trabalhadores, nas dependências de fazenda de propriedade do parlamentar e administrada pelo co-denunciado. O Ministério Público Federal atribui aos denunciados o possível aliciamento de trabalhadores rurais — em unidade da federação distante daquela em que o trabalho seria prestado — com a conseqüente frustração de seus direitos trabalhistas. Afirma que tais trabalhadores teriam sido reduzidos a condição análoga à de escravos, ante as condições degradantes de trabalho, a jornada exaustiva e a restrição de locomoção por dívidas contraídas. Registra, ainda, que o mencionado relatório de fiscalização detectara que o alojamento para os trabalhadores consistiria em ranchos de folhas de palmeiras, sem qualquer beneficiamento do piso, sendo que um deles levantado sobre um brejo com mau cheiro e excessiva umidade. Constatara, também, a presença de trabalhadores enfermos e com lesões nas mãos. Verificara, ainda, inexistir: a) cozinha e sim fogareiros improvisados; b) refeitório; c) sanitário e água potável; d) fornecimento de equipamento individual de trabalho e material de primeiros socorros, tendo os trabalhadores que comprá-los em armazém existente na fazenda, assim como os alimentos de que necessitavam. O parlamentar sustenta em sua defesa que: a) interpusera recurso perante a Delegacia Regional do Trabalho e, em razão disso, a punibilidade estaria condicionada à decisão administrativa; b) todos os empregados foram unânimes ao afirmar que não eram proibidos de sair da fazenda; c) o vínculo de trabalho na fazenda era temporário; d) os empregados faziam refeições sem qualquer desconto na diária; e) a venda de mercadorias pelo empregador não seria proibida e f) o fato de ser proprietário da fazenda não o vincularia criminalmente à imputação penal. O co-denunciado, por sua vez, alega que: a) o Senador apenas o nomeara como procurador para comparecer à cidade na qual arregimentados os trabalhadores, com o fim de efetivar o pagamento das verbas trabalhistas impostas pelos auditores-fiscais e b) não seria administrador da fazenda, pois, à época dos fatos, era assessor de Governador.
Inq 2131/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 7.10.2010. (INQ-2131)
A Min. Ellen Gracie, relatora, recebeu a denúncia por reputar preenchidos os requisitos legais (CPP, art. 41). Inicialmente, salientou que a existência de processo trabalhista não teria o condão de afastar o exame do juízo de admissibilidade da denúncia. Destacou, no ponto, o ajuizamento de recurso trabalhista pelo parquet e a independência entre a instância trabalhista e a penal. Em seguida, reiterou que a investigação fora realizada por grupo de fiscalização que contara com a atuação de auditores-fiscais do trabalho e outros servidores do MTE, de procurador do Ministério Público do Trabalho, de delegado, escrivão e agentes do Departamento de Polícia Federal. Observou que, nos últimos anos, houvera a edição de leis que alteraram a disciplina legal referente aos crimes relacionados à organização do trabalho e à liberdade pessoal no exercício de atividade laboral. Aludiu, em especial, à Lei 9.777/98 — que ampliou o rol de condutas que podem se amoldar ao crime de frustração de direito assegurado por lei trabalhista, inclusive com a previsão da prática do truck system (forma de pagamento de salários em mercadorias), mantendo armazéns na fazenda para fornecimento de produtos e mercadorias aos trabalhadores mediante desconto dos valores no salário — e à Lei 10.803/2003 — que estendeu o rol de condutas amoldadas ao delito de redução a condição análoga à de escravo. Citou, também, que o único instrumento internacional a conceituar a escravidão seria o Tratado de Roma (art. 7º). Enfatizou que as condutas descritas nos referidos tipos penais atentariam contra o princípio da dignidade da pessoa humana sob o prisma tanto do direito à liberdade quanto do direito ao trabalho digno. Aduziu, ademais, a possibilidade de coexistência dos crimes dos artigos 149, 203 e 207, todos do CP, sem que se cogitasse de consunção. Relativamente ao delito de redução a condição análoga à de escravo (CP, art. 149), consignou que a fiscalização do MTE demonstrara as péssimas condições de alojamento, fornecimento de água, jornada diária superior ao limite de 2 horas excedentes (12 horas-diárias, salvo nos domingos em que seria de 6 horas-diárias) e ausência de repouso semanal remunerado. Haveria, ainda, cópias de lançamentos contábeis acerca das dívidas assumidas por vários trabalhadores no armazém informalmente mantido na fazenda. Considerou que a imputação referente ao possível cometimento do crime do art. 207 do CP, na modalidade de recrutamento de trabalhadores fora da localidade de execução do trabalho, não assegurando condições de seu retorno ao lugar de origem, também encontraria substrato probatório produzido durante as investigações. Assinalou que a fraude descrita consistiria em promessas de salários e outros benefícios trabalhistas por ocasião da contratação. No que concerne ao crime do art. 203 do CP, referente à frustração, mediante fraude, de direitos assegurados pela legislação trabalhista, ressaltou a lavratura dos autos de infração por parte dos auditores do MTE, em face da não formalização de contrato de trabalho.
Inq 2131/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 7.10.2010. (INQ-2131)
A relatora, em passo seguinte, analisou as alegações formuladas pelo parlamentar. Rejeitou o pleito de se aguardar a suspensão do procedimento administrativo no âmbito do MTE, porquanto deveria prevalecer o princípio da independência das instâncias e inexistiria força vinculante do julgamento desse feito administrativo na esfera criminal. Afastou, também, a alegação de atipicidade da conduta relativa ao art. 149 do CP — em virtude da existência de elementos mínimos de prova a autorizar o recebimento da peça acusatória —, bem como a assertiva de responsabilidade objetiva do parlamentar — haja vista a narrativa de concurso de agentes e a informação de que as atividades seriam voltadas à exploração agropecuária da fazenda, sendo, por isso, inequívoco o benefício do proprietário. Afirmou, também, que a circunstância de o serviço desempenhado na fazenda ser transitório não modificaria o quadro jurídico da denúncia. Mencionou que os argumentos acerca da inexistência de armazém na fazenda, de ausência de jornada exaustiva, de inocorrência de condições degradantes de trabalho e de não-caracterização de trabalho sem remuneração deverão ser examinados em outra etapa do processo. Relativamente às questões apresentadas pelo co-denunciado, a relatora asseverou que o argumento de que ele não seria administrador da fazenda poderia vir a ser refutado pelos testemunhos dos trabalhadores. Por fim, asseverou que a comprovação de vínculo funcional com o governo não excluiria, de imediato, a imputação dos fatos em concurso de agentes. Após, pediu vista dos autos o Min. Gilmar Mendes.
Inq 2131/DF, rel. Min. Ellen Gracie, 7.10.2010. (INQ-2131)
O Tribunal resolveu questão de ordem suscitada em ação penal, movida pelo Ministério Público Federal contra diversas pessoas acusadas da suposta prática de crimes ligados ao esquema denominado “Mensalão”, para indeferir a renovação de interrogatórios. A defesa pleiteava que os réus fossem ouvidos novamente, haja vista as modificações promovidas pela Lei 11.719/2008, que alterou o momento em que efetuado o interrogatório, transferindo-o para o final da instrução. Aduziu-se que, no caso, quando sobreviera o novel regramento, os acusados já teriam sido interrogados, com observância de todos os direitos e as garantias, de acordo com a Lei 8.038/90, a qual institui normas procedimentais específicas para os processos de competência do STF e do STJ. Assentou-se, assim, a validade dos interrogatórios realizados segundo a legislação então vigente. Salientou-se que o tema relativo à incidência, ou não, da mencionada Lei 11.719/2008 aos feitos de competência originária do STF ficaria em aberto, devendo ser apreciado pela Corte naquelas hipóteses em que ainda não realizado o interrogatório. O relator, ao aplicar o princípio da especialidade, deixou consignado, desde logo, que a nova norma legislativa não alteraria o procedimento previsto na Lei 8.038/90, uma vez que a fase processual em que deve ocorrer o interrogatório continua expressamente prescrita no seu art. 7º (“Recebida a denúncia ou a queixa, o relator designará dia e hora para o interrogatório, mandando citar o acusado ou querelado e intimar o órgão do Ministério Público, bem como o querelante ou o assistente, se for o caso.”).
AP 470 Oitava-QO/DF, rel. Min. Joaquim Barbosa, 7.10.2010. (AP-470)
REPERCUSSÃO GERAL
O Tribunal resolveu questão de ordem suscitada pelo Min. Gilmar Mendes, em recurso extraordinário do qual relator, em que discutida a possibilidade de extensão do índice de reajuste de 28,86% aos militares contemplados com índices inferiores pelas Leis 8.622/93 e 8.627/93, para: a) reconhecer a repercussão geral da questão analisada neste recurso; b) também reconhecer a repercussão geral da extensão do reajuste de 28,86% aos servidores civis, ressaltando, quanto a essa matéria, entendimento consolidado pela edição do Enunciado 672 da Súmula do STF (“O reajuste de 28,86%, concedido aos servidores militares pelas Leis 8622/1993 e 8627/1993, estende-se aos servidores civis do poder executivo, observadas as eventuais compensações decorrentes dos reajustes diferenciados concedidos pelos mesmos diplomas legais”); c) reafirmar a jurisprudência da Corte segundo a qual há de se estender o reajuste de 28,86% aos servidores militares contemplados com índices inferiores pelas Leis 8.622/93 e 8.627/93, já que se trata de revisão geral dos servidores públicos, observadas, entretanto, as compensações de reajustes concedidos e a limitação temporal da Medida Provisória 2.131/2000, atual Medida Provisória 2.215-10/2001; d) prover parcialmente este recurso extraordinário, apenas para limitar as diferenças devidas à data em que entrara em vigor a referida medida provisória; e) autorizar o STF e os demais tribunais a adotar procedimentos relacionados à repercussão geral, principalmente a retratação de decisões ou a declaração de prejuízo de recursos extraordinários, sempre que as decisões contrariarem ou confirmarem, respectivamente, a jurisprudência ora reafirmada. Alguns precedentes citados: RE 408754 AgR/BA (DJU de 25.2.2005); RMS 22307/DF (DJU de 13.6.1997); RE 410778/RS (DJU de 26.8.2005); RE 580108 QO/SP (DJe de 5.2.2009).
RE 584313 QO/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 6.10.2010. (RE-584313)
1ª parte
2ª parte
3ª parte
A Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus impetrado em favor de acusado pela suposta prática de delitos previstos na Lei 8.666/93, no qual se alegava a inépcia da denúncia e a atipicidade das condutas imputadas ao paciente. Pretendia a impetração, sob alegada ausência de justa causa, o trancamento da ação penal. No que se refere à apontada inépcia da denúncia, afirmou-se que ela consignara a qualidade de administrador e sócio da empresa contratada. Assentou-se, daí, que a responsabilidade, se procedente a imputação, seria subjetiva. No tocante à tipologia, ou seja, se o procedimento estaria, ou não, enquadrado na Lei das Licitações, aduziu-se que o art. 96 desse diploma legal não se referiria a serviços, mas a bens. Assim, conferiu-se interpretação sistemática a ponto de se entender que no vocábulo “bens” se teria a inclusão de serviços. Para tanto, considerou-se o disposto no art. 1º dessa mesma lei, a revelar que o diploma versaria licitações e contratos administrativos pertinentes a obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações e locações no âmbito dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios. Ressaltou-se que, na denúncia, aludira-se, também, ao art. 92 da Lei 8.666/93 que teria uma abrangência a apanhar a prestação de serviços. Registrou-se que a referência na peça acusatória não vincularia o juízo e que o pano de fundo — aditamento com majoração substancial do que contratado inicialmente com a Administração Pública — sinalizaria, em princípio, uma prática delituosa. O Min. Ricardo Lewandowski salientou que a denúncia descreveria adequadamente os fatos, pelo menos para propiciar a defesa ao paciente, e que o acusado se defenderia deles e não da imputação jurídica. Vencido o Min. Dias Toffoli que concedia a ordem para trancar a ação penal, ao fundamento de ocorrência de responsabilidade objetiva.
HC 102063/ES, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-102063)
A Turma, ante a excepcionalidade do caso, deferiu habeas corpus para conceder liberdade provisória aos pacientes, presos preventivamente, desde 2003, pela suposta prática do crime de homicídio qualificado. Reputou-se, inicialmente, não se tratar de superação do Enunciado 691 da Súmula do STF, pois o pedido de liminar no writ impetrado perante o STJ ainda não teria sido apreciado naquela Corte e o feito sequer possuiria relator. Aduziu-se a excessiva demora na constrição cautelar. Estabeleceram-se, por fim, algumas condições a que os pacientes deverão se submeter, dentre elas o compromisso de comparecimento a todos os atos do processo e a proibição de se ausentarem do distrito da culpa sem autorização judicial.
HC 102668/PA, rel. Min. Dias Toffoli, 5.10.2010. (HC-102668)
A Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de condenado pela prática do delito de descaminho (CP, art. 334), no qual se pretendia o trancamento de ação penal, por atipicidade da conduta, com base na aplicação do princípio da insignificância, pois o tributo devido seria inferior a R$ 10.000,00. Considerou-se que, embora o tributo elidido totalizasse R$ 8.965,29, haveria a informação de que o paciente responderia a outro processo — como incurso no mesmo tipo penal — cujo valor não pago à Fazenda Pública, considerados ambos os delitos, seria de R$ 12.864,35. Destacou-se estar-se diante de reiteração de conduta delitiva, pois o agente faria do descaminho seu meio de vida, daí a inaplicabilidade do referido postulado. O Min. Marco Aurélio, relator, enfatizou seu convencimento no sentido de que, sendo o montante superior a R$ 100,00, caberia concluir-se pela tipicidade.
HC 97257/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-97257)
A Turma, por maioria, denegou habeas corpus em que alegada a nulidade de laudo pericial mediante o qual reconhecida a existência de qualificadora pertinente ao rompimento de obstáculo em crime de furto. A defesa alegava inexistência de relação entre a habilitação técnica dos peritos nomeados e a natureza do exame realizado, bem como ausência de indicação da metodologia por eles utilizada para a resposta dos quesitos, em dissonância com o que exigido pela legislação processual penal. Sustentava ser aplicável ao fato, ademais, o princípio da insignificância. Para evitar supressão de instância, conheceu-se da impetração, apenas na parte relativa à suposta nulidade. Nessa parte, entendeu-se idônea a perícia realizada, pois, comprovada a ausência de peritos oficiais, foram nomeados 2 peritos, ambos com curso superior, atendidos, portanto, os requisitos contidos nos artigos 159, § 1º, e 171, do CPP. Vencido o Min. Marco Aurélio, relator, que deferia a ordem. Reputava ser necessário harmonizar-se o sistema processual como um todo, de modo a interpretar-se a legislação instrumental penal em conjunto com a instrumental civil, na qual se exige que os peritos comprovem sua especialidade na matéria sobre a qual deverão opinar, nos termos do art. 145, § 2º, do CPC (“Os peritos comprovarão sua especialidade na matéria sobre que deverão opinar, mediante certidão do órgão profissional em que estiverem inscritos”). Aduzia também configurar nulidade a não descrição da metodologia utilizada na elaboração do “auto de constatação de dano”, de forma a desclassificar o delito para furto simples.
HC 99035/RS, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 5.10.2010. (HC-99035)
A Turma, por maioria, deferiu habeas corpus para que o tribunal de justiça de origem aprecie medida de igual natureza lá impetrada — em que se discute a exclusão de anotação de falta grave cometida pelo paciente —, mas que não fora conhecida ao fundamento de que a decisão desafiaria agravo em execução. Consignou-se que, diante da passagem do tempo, não seria possível a interposição do referido recurso de agravo em execução, restando apenas a via do habeas corpus, sob pena de o paciente ficar sem jurisdição. Ademais, asseverou-se que o writ não sofre o empecilho da coisa julgada e, menos ainda, o da preclusão. Vencido o Min. Ricardo Lewandowski, relator, que, além de ressaltar que a matéria não fora apreciada pelas instâncias inferiores, considerava, no caso, o habeas corpus infrutífero, já que incabível, na sede eleita, a análise dos requisitos para a progressão de regime, obstada em virtude da falta disciplinar praticada.
HC 104190/SP, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-104190)
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se sustenta a necessidade de dupla intimação da sentença condenatória: a do réu militar e a do advogado por ele constituído. O Min. Marco Aurélio, relator, concedeu a ordem para declarar insubsistente a certidão alusiva ao trânsito em julgado, devendo ser o réu cientificado pessoalmente do acórdão condenatório. Entendeu indispensável tanto a intimação do advogado como a do réu. Consignou que, em face do critério da especialidade, não se aplicaria o Código de Processo Penal comum — que apenas exige a dupla intimação quando o réu estiver sob a custódia do Estado — e sim, o Militar, a partir da interpretação sistemática do seus artigos 288, 443, 445, 446 e 537 (“Art 288. As intimações e notificações, para a prática de atos ou seu conhecimento no curso do processo, poderão, salvo determinação especial do juiz, ser feitas pelo escrivão às partes, testemunhas e peritos, por meio de carta, telegrama ou comunicação telefônica, bem como pessoalmente, se estiverem presentes em juízo, o que será certificado nos autos. Residente fora da sede do juízo 1º A intimação ou notificação a pessoa que residir fora da sede do juízo poderá ser feita por carta ou telegrama, com assinatura da autoridade judiciária. Intimação ou notificação a advogado ou curador 2º A intimação ou notificação ao advogado constituído nos autos com podêres ad juditia , ou de ofício, ao defensor dativo ou ao curador judicial, supre a do acusado, salvo se êste estiver prêso, caso em que deverá ser intimado ou notificado pessoalmente, com conhecimento do responsável pela sua guarda, que o fará apresentar em juízo, no dia e hora designados, salvo motivo de fôrça maior, que comunicará ao juiz. ... Art. 443. Se a sentença ou decisão não fôr lida na sessão em que se proclamar o resultado do julgamento, sê-lo-á pelo auditor em pública audiência, dentro do prazo de oito dias, e dela ficarão, desde logo, intimados o representante do Ministério Público, o réu e seu defensor, se presentes. ... Art. 445. A intimação da sentença condenatória será feita, se não o tiver sido nos têrmos do art. 443: a) ao defensor de ofício ou dativo; b) ao réu, pessoalmente, se estiver prêso; c) ao defensor constituído pelo réu. Intimação a réu sôlto ou revel. Art. 446. A intimação da sentença condenatória a réu sôlto ou revel far-se-á após a prisão, e bem assim ao seu defensor ou advogado que nomear por ocasião da intimação, e ao representante do Ministério Público. ... Art 537. O diretor-geral da Secretaria do Tribunal remeterá ao auditor cópia do acórdão condenatório para que ao réu, seu advogado ou curador, conforme o caso, sejam feitas as devidas intimações. 1º Feita a intimação ao réu e ao seu advogado ou curador, será enviada ao diretor-geral da Secretaria, para juntada aos autos, a certidão da intimação passada pelo oficial de justiça ou por quem tiver sido encarregado da diligência. 2º O procurador-geral terá ciência nos próprios autos.”). Após, pediu vista o Min. Dias Toffoli.
HC 99109/RJ, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-99109)
Portador do Vírus HIV e Tentativa de Homicídio - 2
Em conclusão de julgamento, a Turma deferiu habeas corpus para imprimir a desclassificação do delito e determinar o envio do processo para distribuição a uma das varas criminais comuns estaduais. Tratava-se de writ em que se discutia se o portador do vírus HIV, tendo ciência da doença e deliberadamente a ocultando de seus parceiros, teria praticado tentativa de homicídio ao manter relações sexuais sem preservativo. A defesa pretendia a desclassificação do delito para o de perigo de contágio de moléstia grave (CP: “Art. 131 Praticar, com o fim de transmitir a outrem moléstia grave de que está contaminado, ato capaz de produzir o contágio: ...”) — v. Informativo 584. Entendeu-se que não seria clara a intenção do agente, de modo que a desclassificação do delito far-se-ia necessária, sem, entretanto, vinculá-lo a um tipo penal específico. Tendo em conta que o Min. Marco Aurélio, relator, desclassificava a conduta para o crime de perigo de contágio de moléstia grave (CP, art. 131) e o Min. Ayres Britto, para o de lesão corporal qualificada pela enfermidade incurável (CP, art. 129, § 2º, II), chegou-se a um consenso, apenas para afastar a imputação de tentativa de homicídio. Salientou-se, nesse sentido, que o Juiz de Direito, competente para julgar o caso, não estaria sujeito sequer à classificação apontada pelo Ministério Público.
HC 98712/SP, rel. Min. Marco Aurélio, 5.10.2010. (HC-98712)
A Turma iniciou julgamento de habeas corpus em que se reitera a alegação de nulidade de acórdão do TRF da 4ª Região, em virtude de: a) ausência de intimação de advogado do paciente, ora impetrante, da pauta de julgamento de apelação e de seu resultado e b) não-participação de revisor original na sessão de julgamento de recurso criminal. Na espécie, a Corte Federal, ao dar parcial provimento à apelação da defesa, diminuíra, pela metade, a sanção imposta ao paciente, substituindo a pena privativa de liberdade por restritiva de direito, mantida a multa arbitrada na sentença. Sustenta a impetração ofensa à ampla defesa, tendo em conta a intimação realizada com o vocábulo “e outro”, em fase recursal. Nessa intimação, constaria expressamente o nome de advogado substabelecido, com reserva de iguais poderes, no Juízo processante, o qual, entretanto, não subscrevera a petição de interposição e de razões recursais da apelação. Diz, ainda, que fora violada a garantia do devido processo legal e o princípio do juiz natural, em razão de ter participado do colegiado juíza convocada em substituição de revisor que teria aposto visto e requerido dia para julgamento.
HC 102433/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 5.10.2010. (HC-102433)
A Min. Ellen Gracie, relatora, denegou o writ. Inicialmente, observou que o tema relativo à falta de intimação do causídico não fora examinada pelo STJ, por se tratar de pedido idêntico ao de outro habeas corpus lá impetrado. Realçou que o impetrante não seria o único defensor do paciente na ação penal instaurada; que os defensores teriam sido intimados da sessão de julgamento do recurso criminal; e que o endereço profissional indicado pelo impetrante e pelo advogado substabelecido no juízo processante seria o mesmo. Consignou a ausência de manifestação pela defesa, tanto na ação penal quanto na apelação, no sentido de que as publicações fossem realizadas em nome exclusivo do advogado subscritor deste writ. A relatora, no ponto, assinalou que tal advogado sequer peticionara para comunicar que o defensor substabelecido na ação penal não mais comporia a equipe de defesa. Asseverou não haver qualquer nulidade processual relacionada à intimação da pauta de julgamento de apelação efetuada em nome do mencionado substabelecido “e outro”. Ressaltou o entendimento do Supremo segundo o qual, havendo mais de um advogado regularmente constituído, sem nenhuma ressalva ao recebimento de intimação, basta, para sua validade, que a publicação seja feita em nome de um deles. No tocante a não-participação de revisor original, não vislumbrou qualquer ilegalidade referente ao ato que, nos termos do regimento interno, determinara a substituição do revisor, que se encontrava em férias, pela juíza federal convocada. Salientou que a magistrada não só demonstrara haver efetivamente revisado o caso concreto, como, inclusive, proferira voto que se tornara o condutor do acórdão, reduzindo o quantum da pena do condenado, beneficiando-o. Entendeu que o fato de a juíza integrar a turma julgadora como revisora não seria capaz de acarretar, por si só, a nulidade do processo, sem a demonstração de efetivo prejuízo para a defesa, de acordo com o princípio pas de nullité sans grief, adotado pelo art. 563 do CPP. Relembrou jurisprudência desta Corte no sentido de que a demonstração de prejuízo, a teor desse dispositivo, é essencial à alegação de nulidade, seja ela relativa ou absoluta, além de precedente da 2ª Turma no qual se declarara que, não comprovada a configuração de prejuízo, não haveria que se falar em cerceamento de defesa (Enunciado 523 da Súmula do STF), quando juiz federal integrasse o órgão colegiado como revisor. Concluiu não estar demonstrado o efetivo prejuízo suportado pelo paciente em virtude da substituição de revisor pela juíza federal convocada.
HC 102433/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 5.10.2010. (HC-102433)
Em divergência, o Min. Celso de Mello deferiu o habeas corpus em ordem a invalidar o julgamento desde a apreciação do recurso de apelação, inclusive. Considerou que uma situação específica como a dos autos frustraria a plenitude do direito de defesa e, com isso, comprometeria a proteção judicial efetiva que se deveria dispensar notadamente nas hipóteses em que o Estado faz instaurar contra alguém um procedimento penal persecutório. Ademais, ressaltou que o CPP, ao tratar do procedimento recursal de apelação, especialmente nos casos de delitos apenados com reclusão, imporia a dualidade de órgãos intervenientes no julgamento daquele recurso em particular, a figurar um relator e um revisor. Reputou ter havido, na situação dos autos, verdadeira confusão, no sentido técnico, ao concentrar-se em uma única pessoa a dupla e incompatível condição de revisor e de relator. Aduziu que a circunstância de não se saber qual seria o voto que o revisor originário iria proferir bastaria para afastar a necessária demonstração de prejuízo, que estaria in re ipsa. Entendeu que, se a petição de interposição e as correspondentes razões foram subscritas por determinados advogados sem que nela interviesse o anteriormente substabelecido, haveria falha administrativa da secretaria do Tribunal que não poderia, simplesmente, acrescentar um outro profissional que se limitara a atuar no primeiro grau de jurisdição. Salientou que o prejuízo causado por esse fato seria evidente, uma vez que a sustentação oral comporia a garantia constitucional do direito de defesa e não poderia ser, portanto, comprometida. Apontou que a inclusão na atuação dos autos na fase recursal de substabelecido, que não subscrevera quaisquer peças da apelação, teria sido realizada, aparentemente, de forma indevida, a comprometer de maneira plena a própria eficácia do direito de defesa, haja vista a ciência dos atos ter sido comunicada a quem, na verdade, já não mais intervinha no procedimento recursal. Após, pediu vista dos autos o Min. Joaquim Barbosa.
HC 102433/PR, rel. Min. Ellen Gracie, 5.10.2010. (HC-102433)
A superveniência de nova condenação definitiva no curso da execução criminal altera a data-base para a concessão de benefícios futuros, sendo indiferente que o crime tenha ocorrido antes ou após o início do cumprimento da pena. Com base nesse entendimento, a Turma indeferiu habeas corpus em que se sustentava a ilegalidade da alteração da data-base para a concessão de benefício, em virtude de nova condenação, decorrente de fato cometido antes do início da execução da pena. Entenderam-se aplicáveis, à espécie, os artigos 111, parágrafo único, e 118, II, da LEP (“Art. 111. Quando houver condenação por mais de um crime, no mesmo processo ou em processos distintos, a determinação do regime de cumprimento será feita pelo resultado da soma ou unificação das penas, observada, quando for o caso, a detração ou remição. Parágrafo único. Sobrevindo condenação no curso da execução, somar-se-á a pena ao restante da que está sendo cumprida, para determinação do regime. ... Art. 118. A execução da pena privativa de liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com a transferência para qualquer dos regimes mais rigorosos, quando o condenado: ... II - sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao restante da pena em execução, torne incabível o regime...”). Ressaltou-se, ainda, que, caso sobrevenha condenação definitiva no curso da execução penal, deverão ser somadas a nova pena e o restante da que está sendo cumprida.
HC 102492/RS, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.10.2010. (HC-102492)
A Turma concedeu habeas corpus para que o Juízo de Execuções Criminais proceda a novo exame de pedido de comutação de pena do paciente, devendo verificar a existência de preenchimento dos requisitos objetivos constantes do Decreto 5.620/2005, inclusive, alterando, se for o caso, o quantum de pena comutado posteriormente com base nos Decretos 5.993/2006 e 6.294/2007. Na espécie, a defesa requeria a nulidade de decisão do Juízo de Execuções que denegara ao paciente o direito à comutação de pena, prevista no Decreto 5.620/2005 — que concede indulto condicional, comutação e dá outras providências —, tendo em conta o que disposto no art. 88 do CP (“Revogado o livramento, não poderá ser novamente concedido, e, salvo quando a revogação resulta de condenação por outro crime anterior àquele benefício, não se desconta na pena o tempo em que esteve solto o condenado”). Afirmou-se que o mencionado artigo veda a concessão de novo livramento condicional quando o primeiro tiver sido revogado em razão de cometimento de crime posterior, bem como proíbe que o tempo em que o agente permanece solto seja descontado da pena. Contudo, entendeu-se que os requisitos do instituto da comutação da pena não se confundiriam com os referentes ao instituto do livramento condicional. Ressaltou-se que o art. 88 do CP prescreveria matéria atinente à impossibilidade de concessão de novo livramento condicional e não de concessão de comutação.
HC 98422/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 5.10.2010. (HC-98422)
Sessões | Ordinárias | Extraordinárias | Julgamentos |
Pleno | 6.10.2010 | 7.10.2010 | 216 |
1ª Turma | 5.10.2010 | — | 20 |
2ª Turma | 5.10.2010 | — | 175 |
DJE de 8 de outubro de 2010
REPERCUSSÃO GERAL EM AI N. 791.811-SP
RELATOR: MIN. DIAS TOFFOLI
EMENTA
DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DISCUSSÃO SOBRE A POSSIBILIDADE DE CONTRATAÇÃO DE DETERMINADOS SERVIÇOS, COM DISPENSA DE LICITAÇÃO. CONSEQUÊNCIAS. PRESENÇA DE REPERCUSSÃO GERAL.
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 580.963-PR
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Recurso extraordinário. Benefício assistencial ao idoso (art. 203, V, da Constituição Federal). Discussão sobre critério utilizado para aferir a renda mensal per capita da família da requerente. Alegação de inconstitucionalidade de interpretação extensiva ao art. 34, parágrafo único, da Lei n. 10.741/2003. Tema que alcança relevância econômica, política, social e jurídica e que ultrapassa os interesses subjetivos da causa. Repercussão geral reconhecida.
REPERCUSSÃO GERAL EM RE N. 603.616-RO
RELATOR: MIN. GILMAR MENDES
Matéria Criminal. Busca e apreensão em residência sem mandado judicial. Inviolabilidade do domicílio. Prova ilícita. Repercussão geral admitida.
Decisões Publicadas: 3
Com a finalidade de proporcionar aos leitores do INFORMATIVO STF uma compreensão mais aprofundada do pensamento do Tribunal, divulgamos neste espaço trechos de decisões que tenham despertado ou possam despertar de modo especial o interesse da comunidade jurídica.
Configuração da Interestadualidade de Tráfico de Drogas (Transcrições)
(v. Informativo 601)
HC 99452/MS*
RELATÓRIO: Trata-se de habeas corpus impetrado pela Defensoria Pública do Estado de Mato Grosso do Sul, em favor de **, contra acórdão formalizado pela Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça, nos autos do Habeas Corpus n.° 119.637/MS, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho. Eis o teor da ementa desse julgado:
PENAL. HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS (ART. 33 DA LEI 11.343/06). CAUSA DE AUMENTO DE PENA. INTERESTADUALIDADE. ART. 40, V, DO MESMO DIPLOMA. CONFIGURAÇÃO. DESNECESSIDADE DE EFETIVA TRANSPOSIÇÃO DE FRONTEIRAS DE ESTADOS DA FEDERAÇÃO. INTENÇÃO QUE NÃO SE CONCRETIZA. INCIDÊNCIA DA MAJORANTE. TRÁFICO INTERNACIONAL. SIMILARIDADE. CAUSA DE DIMINUIÇÃO DE PENA DO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06. APLICAÇÃO NEGADA UNICAMENTE EM RAZÃO DA CONSIDERAÇÃO DE AÇÃO PENAL EM CURSO COMO SUFICIENTE À CARACTERIZAÇÃO DE MAUS ANTECEDENTES. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. OFENSA AO PRINCÍPIO DA PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA. PRECEDENTES DO STJ. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA, APENAS PARA QUE O TRIBUNAL APRECIE A POSSIBILIDADE DE REDUÇÃO DA PENA, COM A ANÁLISE DOS DEMAIS REQUISITOS DO ART. 33, § 4º, DA LEI 11.343/06, DESCONSIDERANDO-SE OS ANTECEDENTES MENCIONADOS.
1. Tal qual o tráfico internacional, não é necessária a efetiva transposição da fronteira interestadual para que fique autorizada a incidência da causa de aumento de pena prevista no art. 40, V, da Lei 11.343/06; bastarão, para tanto, evidências de que a substância entorpecente mercadejada tem como destino qualquer ponto além das linhas divisórias estaduais. Precedente da 5ª Turma: HC 93.223/MS, Rel. Min. NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, DJU 13.10.08).
2. A jurisprudência das Cortes Superiores afirma que há constrangimento ilegal quando Ações e Inquéritos em andamento são considerados como maus antecedentes e personalidade voltada para o crime; dessa forma, a existência de ação penal em curso não caracteriza maus antecedentes criminais para o fim de obstar a aplicação da causa de diminuição de pena prevista no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/06.
3. Parecer do MPF pela concessão parcial da ordem.
4. Ordem parcialmente concedida, apenas para que o Tribunal a quo aprecie a possibilidade de redução da pena do paciente, com a análise dos demais requisitos do art. 33, § 4º, da lei 11.343/06, desconsiderando-se os antecedentes mencionados.
Conforme consta dos autos, o paciente foi condenado à pena de 6 (seis) anos e 8 (oito) meses de reclusão, em regime inicialmente fechado, e ao pagamento de 660 (seiscentos e sessenta) dias-multa, pela prática do delito tipificado no art.33, caput, c/c art.40, inciso V, ambos da Lei 11.343/2006.
Inconformada, a defesa interpôs recurso de apelação, ao qual, por maioria, foi negado provimento, dando ensejo à interposição de embargos infringentes, que foram rejeitados.
Diante dessa decisão, a defesa impetrou ordem de habeas corpus perante o Superior Tribunal de Justiça, e obteve denegação da ordem, consoante se infere da ementa transcrita.
Neste writ, a defesa reforça os fundamentos dos habeas corpus submetidos a exame do Superior Tribunal de Justiça no intuito de requerer a concessão da ordem “para o fim de decotar da condenação o indevido reconhecimento da interestadualidade do tráfico (art.40, V, da Lei n.° 11.343/06)”.
A Procuradoria-Geral da República manifestou-se pela denegação da ordem.
É o relatório.
VOTO: Consigno que, no caso concreto, a defesa sustenta a necessidade de efetiva transposição da fronteira estadual para caracterizar a causa de aumento de pena prevista no art. 40, inciso V, da Lei n.° 11.343/06.
De início, atesto que a antiga lei de drogas (Lei 6.368/76) tratava das causas de aumento de pena, em seu art. 18, nos seguintes termos:
Art. 18. As penas dos crimes definidos nesta Lei serão aumentadas de um terço a dois terços:
I - no caso de tráfico com o exterior ou de extraterritorialidade da lei penal;
II - quando o agente tiver praticado o crime prevalecendo-se de função pública relacionada com a repressão à criminalidade ou quando, muito embora não titular de função pública, tenha missão de guarda e vigilância;
III - se qualquer deles decorrer de associação ou visar a menores de 21 (vinte e um) anos ou a quem tenha, por qualquer causa, diminuída ou suprimida a capacidade de discernimento ou de autodeterminação;
IV - se qualquer dos atos de preparação, execução ou consumação ocorrer nas imediações ou no interior de estabelecimentos de ensino ou hospitalar, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo de estabelecimentos penais, ou de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, sem prejuízo da interdição do estabelecimento ou do local.
Por sua vez, a Lei 11.343/2006 trata das majorantes em seu art.40, que assim dispõe:
Art. 40. As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:
I - a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato evidenciarem a transnacionalidade do delito;
II - o agente praticar o crime prevalecendo-se de função pública ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância;
III - a infração tiver sido cometida nas dependências ou imediações de estabelecimentos prisionais, de ensino ou hospitalares, de sedes de entidades estudantis, sociais, culturais, recreativas, esportivas, ou beneficentes, de locais de trabalho coletivo, de recintos onde se realizem espetáculos ou diversões de qualquer natureza, de serviços de tratamento de dependentes de drogas ou de reinserção social, de unidades militares ou policiais ou em transportes públicos;
IV - o crime tiver sido praticado com violência, grave ameaça, emprego de arma de fogo, ou qualquer processo de intimidação difusa ou coletiva;
V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal;
VI - sua prática envolver ou visar a atingir criança ou adolescente ou a quem tenha, por qualquer motivo, diminuída ou suprimida a capacidade de entendimento e determinação;
VII - o agente financiar ou custear a prática do crime.
Conforme se depreende dos artigos transcritos, a disposição atual é mais ampla, abarcando situações anteriormente não previstas, tal como a inovação disposta especificamente no inciso V, “o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal.”
Como atestado na obra coordenada por Luiz Flávio Gomes “Lei de Drogas Comentada”:
“Esta inovação atendeu a reivindicação da doutrina especializada. Na vigência da Lei 6.368/76 reclamava (e sugeria) Valdir Sznick: ‘Entendemos que, como agravante, caberia aqui o tráfico interestadual, por sinal, cada vez mais, bastante ativo. Se este tráfico for coibido mais intensamente, em especial no Mato Grosso e Estados do Nordeste a traficância, no caso interno, se reduziria bastante. Não se justifica, a não ser para atender ao previsto nos acordos internacionais, a punição, como aqui neste inciso, apenas de tráfico só internacional, relegando a segundo plano o tráfico interestadual, mais intenso e, quiça pernicioso como se não existisse ou fosse inexpressivo’.(GOMES, Luiz Gomes (Org.).Lei de Drogas Comentada. 2.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, p. 221).
Diante disso, sob o aspecto da política criminal adotada, a mencionada inovação visou, acertadamente, coibir a expansão do tráfico de entorpecentes entre as unidades da Federação. Ademais, ao tratar a interestadualidade como causa de aumento de pena, a nova lei teve a oportunidade de dar concretude ao princípio da individualização da pena (CF, art. 5º, XLVI), sobretudo, levando-se em conta o maior grau de reprovabilidade da conduta.
Assim, entendo que a configuração da interestadualidade do tráfico de entorpecentes prescinde da efetiva transposição das fronteiras do Estado, bastando, tão somente, elementos que sinalizem a destinação da droga para além dos limites estaduais.
Guardada as devidas proporções, colho precedentes desta Corte:
DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTE. ARTIGOS 12 E 18, I, DA LEI Nº 6.368, DE 21.10.1976. CRIME PROVOCADO. FLAGRANTE FORJADO OU PREPARADO. PENA: AUMENTO (ART. 18, I, DA LEI).
1. Não fica evidenciada hipótese de crime provocado, ou de flagrante forjado, se os agentes participam da obtenção, da guarda e do transporte de cocaína, que se destina ao exterior, consistindo a atividade da Polícia, apenas, em obter informações sobre o propósito deles e em acompanhar seus passos, até a apreensão da droga, em pleno transporte, ainda no Brasil, seguida de prisão em flagrante. 2. Destinando-se a droga ao exterior, incide a majorante do inc. I do art. 18 da Lei nº 6.368, de 21.10.1976, ainda que aquela não chegue até lá, pois o que se quer punir, com maior severidade, mediante esse aumento de pena, é a atividade mais audaciosa dos agentes, que se animam a um tráfico internacional e adotam todas as providências para que ele se viabilize, como ocorreu no caso, apesar da frustração, ditada pela diligência da Polícia. 3. “Habeas Corpus” indeferido. Decisão unânime.
(HC 74510, Relator(a): Min. SYDNEY SANCHES, Primeira Turma, julgado em 08/10/1996, DJ 22-11-1996 PP-45690 EMENT VOL-01851-03 PP-00618) “
Habeas corpus. 2. Impetrações anteriores em favor dos pacientes e co-réus, no mesmo processo-crime: HC n.os 74.083-9, 74.687-0 e 75.405-8. 3. No caso concreto, invoca-se nulidade das provas colhidas, porque inadmissíveis, à vista do art. 5º, LVI, da Constituição, eis que obtidas com ofensa ao item XI do mesmo art. 5º da Lei Maior. 4. Encontrando-se o barco estrangeiro, já em condições de zarpar para o exterior, à evidência, não há ver, na atuação da Polícia Federal, ofensa ao art. 5º, XI, da Constituição. Cuidava-se de situação de flagrante delito, ocorrendo a imediata apreensão do volumoso carregamento de cocaína, a configurar tráfico internacional de entorpecentes. 5. Habeas corpus indeferido. (HC 77525, Relator(a): Min. NÉRI DA SILVEIRA, Segunda Turma, julgado em 20/10/1998, DJ 10-08-2000 PP-00005 EMENT VOL-01999-03 PP-00518)
Nesse sentido, também a doutrina:
“Tráfico interestadual de drogas. Trata-se de condição objetiva de aumento de pena o fato de o crime caracterizar-se como interestadual. Ainda que objetiva, para a sua aplicação, o agente tem de saber dessa circunstância ou pelo menos ter consciência da possibilidade consistente de que isso está ocorrendo ou ocorrerá. Esse conhecimento se afere por circunstâncias externas, como por exemplo a remessa interestadual ou outras, que serão análogas às do inciso I, isto é, a natureza, a procedência da substância ou do produto apreendido e as circunstâncias do fato. (...)” (FILHO, Vicente Greco; RASSI, João Daniel. Lei de Drogas Anotada. 2.ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p.146-147).
No caso concreto, o paciente foi preso em flagrante, no interior de um ônibus que fazia o trajeto Campo Grande/MS a Cuiabá/MT, transportando em sua mochila 8,6 kg de substância entorpecente (maconha).
Ressalto que, tanto na fase inquisitorial quanto em juízo, o paciente confessou a intenção de transportar a droga, adquirida em Campo Grande/MS, para a cidade de Rondonópolis/MT. Nesse ponto, confira-se trecho da sentença:
“(...) **, qualificado nos autos, foi denunciado pelo Ministério Público Estadual como incurso nas penas do artigo 33 c.c art. 40, V, ambos da Lei 11.343/06, pelos fatos assim descritos na denúncia:
“Consta dos inclusos autos de inquérito policial, que no dia 04.07.2007, na BR 163, KM 611,8, no Posto da Polícia Rodoviária Federal, neste Município, o denunciado ** foi surpreendido transportando 8.600g (oito mil e seiscentos gramas) de substância entorpecente, qual seja, “cannabis sativa” conhecida vulgarmente por “maconha”, envolto em 14 (quatorze) tabletes mais 01 (uma) “trouxinha” cujo uso é proscrito no Brasil (Auto de Apreensão de f. 20 e Laudo de Constatação Preliminar f. 22), sem autorização e em desacordo com determinação legal ou regulamentar.
O denunciado levaria a droga da cidade de Campo Grande/MS para Rondonópolis-MT (f. 06).
2. Segundo restou apurado, no dia dos fatos, em fiscalização de rotina na BR 163, os Policiais Rodoviários Federais ** e ** abordaram o ônibus da empresa Motta Ltda, prefixo 20102, itinerário Campo Grande/MS x Cuiabá/MT e, em vistoria ao interior do referido veículo, localizaram junto à poltrona do denunciado uma mochila, contendo em seu interior dois tabletes com entorpecente acima descrito. Indagado sobre a mochila, o denunciado ** admitiu ser o proprietário da mesma, bem como da droga. Confessou, ainda, que adquiriu a droga na cidade de Campo Grande/MS e tinha como destino a cidade de Rondonópolis/MT (f. 23). Diante dos fatos o denunciado foi preso em flagrante.
3. A materialidade delitiva resta comprovada pelo Auto de Apreensão de f. 20, Laudo de Exame de Constatação Preliminar de f. 22, documentos acostados à fl. 23 e demais depoimentos colhidos nos autos.”
(...)
A imputação feita ao acusado ** restou cabalmente demonstrada, de modo que impõe-se sua condenação.
As provas colhidas nos autos durante toda persecução criminal são suficientes e robustas, dando conta da conduta delitiva do réu.
Com efeito, em Juízo (f. 58/60) o réu confirmou a autoria delitiva, afirmando que “são verdadeiros narrados na denúncia. Que foi contratado por Baiano na cidade de Rondonópolis/MT, onde mora o interrogado. Que o trato seria de receber R$ 200,00 em dinheiro e 15 gramas de pasta base para uso do interrogando. [...]”.
De outra parte, o Policial Rodoviário Federal ** confirmou as declarações prestadas na fase policial, relatando em juízo (f. 61) que:
“Que no momento da abordagem parecia que o acusado havia usado droga, pelo seu jeito. Que o acusado na hora admitiu que a droga estava sendo levada para consumo.”
Destarte, não restam dúvidas de que o acusado praticou a conduta prevista no artigo 33, caput, da Lei 11.343/06, qual seja, transportar ilegalmente substância entorpecente, razão pela qual a condenação pelo delito de tráfico de entorpecentes é medida de rigor.
(...)
O Ministério Público pugnou pelo reconhecimento da causa de aumento mencionada, tendo em vista que o réu declarou em Juízo que a droga apreendida foi adquirida na cidade de Campo Grande - MS e seria levada para a cidade de Rondonópolis - MT.
De outro lado, a defesa, pediu o afastamento da aplicabilidade da causa de aumento do tráfico interestadual, tendo em vista que o transporte da droga não evadiu as fronteiras do Estado.
Não obstante os argumentos da defesa, tem-se, pois, nos autos a situação clara de que a droga apreendida estava encomendada à outro estado da Federação, fazendo incidir, independente da travessia da fronteira entre o estado de saída e o estado de destino, a causa de aumento prevista no art. 40, inciso V, da Lei 11.343/06, verbis:
“Art. 40 - As penas previstas nos arts. 33 a 37 desta Lei são aumentadas de um sexto a dois terços, se:
[...]
V - caracterizado o tráfico entre Estados da Federação ou entre estes e o Distrito Federal;”.
Vale ressaltar que em caso análogo, qual seja, para o tráfico internacional - ainda na vigência da Lei 6.368/76 - já se entendia que a simples verificação da finalidade (transportar droga para outro país) bastava para a incidência da referida majorante.
É por isso que não há razão para afastar a novel causa de aumento do art. 40, inciso V, da Lei 11.343/06, porque a situação é praticamente a mesma do tráfico internacional.
(...)”
Desse modo, em razão de todas as evidências de que a substância entorpecente adquirida no estado do Mato Grosso do Sul teria como destino o Estado do Mato Grosso, afigura-se correta a incidência da causa de aumento prevista no art. 40, inciso V, da Lei 11.343/06.
Ante o exposto, por reputar irretocável o acórdão exarado pelo Superior Tribunal de Justiça, denego a ordem de habeas corpus.
É como voto.
*acórdão publicado no DJe de 8.10.2010
**nomes suprimidos pelo Informativo
INOVAÇÕES LEGISLATIVAS
4 a 8 de outubro de 2010
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF)
Estrutura Administrativa - Competência - Alteração
Ato Regulamentar nº 11/STF, de 29.9.2010 - Altera dispositivos do Regulamento da Secretaria. Publicado no DJe/STF, n. 186, p. 2-3, em 4.10.2010.
Autos - Carga - Fotocópia
Resolução nº 441/STF, de 29.9.2010 - Institui o serviço “Carga Programada” e dá outras providências. Publicada no DJe/STF, n. 186, p. 2, em 4.10.2010.
Processo Eletrônico - Regulamentação
Resolução nº 442/STF, de 5.10.2010 - Revoga os artigos 21, 22 e 33 da Resolução nº 427, de 20 de abril de 2010. Publicada no DJe/STF, n. 190, p. 1, em 8.10.2010.
Secretaria de Documentação
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